Ela é difícil. Só eu sei o que já passei nas patas dessa gata. Apelidada pelo veterinário de Rabo Fino, por causa de uma
dermatite que fez os pelos do rabo dela ficarem bem ralos.
Sei bem pouco do histórico da Diná.
Chegou às minhas mãos como um favor: "fica com ela por algumas semanas, enquanto a reforma no centro de zoonoses não acaba." Ela veio com sete filhotes e sempre foi uma mãe maravilhosa, muito atenciosa, cuidadosa e excelente caçadora.
As semanas foram passando e não vieram buscá-la.
Consegui novos lares pros pequenos, com exceção de um deles, que está comigo até hoje.
O temperamento da Rabo Fino é o pior possível. Totalmente aversa ao contato humano, não aceita carinho, não se aproxima, não permite contato algum, muito embora só queira dormir na cama de um dos meus irmãos. Aprendeu a ir sozinha pro gatil na hora de prender, e aposto que é pra evitar que qualquer um de nós tenha que pegá-la no colo pra isso. Até passar perto dela é complicado, já que ela sempre avança nos pés da gente.
Sempre muito instintiva e de natureza ruim, como diz a minha mãe, só se envereda pro lado de um dos meus cachorros, o poodle Fred. Uma amiga diz que ela tem cara de sofrida, e eu acredito que Diná tenha mesmo sofrido por aí, nas ruas ou nas mãos de alguém que a maltratava.
Mas, como já disse, é uma mãe maravilhosa. Um coração imenso pros filhotes.
Na segunda ninhada dela, já comigo, nasceram quatro bebês. Foi preciso uma cesariana e um deles morreu no parto. Enquanto no veterinário, me ligaram pra saber se eu podia cuidar de um gatinho que tinha sido rejeitado pela mãe. Disse que podíamos tentar, que tinha uma gata recém parida e talvez ela aceitasse.
Dias depois, encontrei uma caixa com quatro gatinhos bem pequenos ainda, e Diná já em casa com as crianças, adotou esses quatro. E assim já amamentava oito filhotes, de tamanhos diferentes.
Mais algumas semanas e apareceram mais dois filhotes. E depois mais CINCO.
Rabo Fino, na sua aversão humana, sempre teve um instinto materno aflorado. De uma só vez, se permitiu ter 15 filhos, que nem todos eram dela.
Tratou todos da mesma forma, com muito amor e sempre que saía pras suas voltinhas diárias, trazia uma caça de presente aos filhotes, já não tão filhotes mais.
Essa gata me deu uma lição. Que sorte eu tive por isso. Ela é um animal "irracional", age por instinto. "Não pensa".
Que bom, não é? Que ser humano, com faculdade mental em dia faria algum assim? Adotaria um único filho sequer, sem antes pensar muito?
Deixaria que o coração falasse, que agisse por instinto, por amor?
Graças a Deus Diná é só uma gata que não pensou nisso e salvou vidas, talvez sem chances se não fosse por ela.
Hoje ela é castrada, vive na minha casa, com todas as regalias que ela merece, como um prêmio pelos 15 filhotes de uma só vez. Na época ela emagreceu um bocado e os cuidados com ela foram triplicados, muita água e comida a vontade, mas hoje é gorda e parruda. Só se engraça pro Fred, na gente muito raramente, só se ela tiver de bom humor.
O rabo
fino, inquieto e desconfiado dela está sempre balançando. É amada pelos humanos da casa, dorme na cama e tem toda a paz de que precisa, pois o papel dela no mundo está cumprido.